Disponibilização: quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano XI - Edição 2513
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toda a água pluvial que deveria ter como destino de escoamento essas bocas de lobo correram superficialmente em direção ao
imóvel do Autor, sendo captadas pela boca de lobo existente na frente do seu imóvel, na altura da quadra de tênis,
sobrecarregando a tubulação lá existente” (fls. 180). (grifei)Adiante, o perito ainda observou que “o rompimento da tubulação
localizada sob a quadra de tênis do Autor se deu por excesso de água que causou uma pressão maior que a suportada pela
tubulação. Sem dúvida nenhuma o fechamento das bocas de lobo foi fator determinante para o colapso da rede, assim como a
existência de água não pluvial nesta mesma tubulação”. (fls. 181) (grifei)Daí porque, ao contrário do que pretende fazer crer o
requerido, não houve o escoamento natural das águas pluviais, eis que verificado o direcionamento artificial para o imóvel do
autor, em virtude do fechamento das bocas de lobo localizadas na parte superior da via pública. Tanto é verdade que o requerido
providenciou a reabertura das bocas de lobo (vide fls. 132/149) , o que justamente foi o objeto da primeira demanda, de modo a
evitar esse escoamento artificial. Ora, segundo a ordem normal das coisas, se estivessem limpas e abertas as bocas de lobo,
haveria o escoamento natural das águas pluviais em frações, o que certamente evitaria o direcionamento artificial para o imóvel
do autor e, por consequência, poderia evitar o colapso da rede de tubulações. De rigor, portanto, a procedência do pedido do
autor atinente a abertura das bocas de lobo, o que foi objeto do primeiro feito, mediante indenização pelo escoamento artificial
das águas pluviais, consistente nas perdas e danos disso decorrentes, para reparação da cratera que se abriu na propriedade
do autor, conforme o menor orçamento (fls. 32), bem como na despesa pela pintura da quadra de tênis.Frise-se, por oportuno,
que incumbia ao requerido a manutenção das áreas comuns (conforme convenção fls. 96), notadamente a fiscalização das
bocas de lobo para escoamento das águas pluviais, o que demonstra sua omissão em tal providência. Ainda sob o enfoque do
primeiro feito, o autor pugnou pela indenização pelos danos morais, o que não merece prosperar, isso porque somente é devido
quando capaz de causar à vítima ofensa à honra subjetiva, por meio da ocorrência de grave abalo psicológico, sofrimento ou
humilhação.É certo que o autor experimentou dissabor, aborrecimento e irritação, em razão de ter seu imóvel danificado e
aguardar pelos reparos, mas não em grau de intensidade capaz de provocar o dano moral, notadamente porque os danos se
deram em área de lazer, o que não interferiu na moradia e descanso do autor.Não se pode esquecer que a frustração e a
contrariedade, em certa medida, fazem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até
no ambiente familiar. Apesar dos aborrecimentos pelos quais possa ter passado a parte autora, é certo que não são suficientes
para caracterizar dano moral, diante da ausência de violação à honra, intimidade, vida privada e imagem do autor, não sendo
possível, portanto, concluir-se pelo cabimento de ressarcimento em seu favor.A despeito da omissão do requerido em manter
abertas as bocas de lobo, não se pode deixar de reconhecer a existência de culpa concorrente.No segundo laudo, elaborado
nos autos digitais (pags. 221/239), o perito foi categórico em afirmar por diversas passagens que não houve culpa do réu, tendo
o autor construído as tubulações que indicam a origem dos problemas. Destaca-se a seguinte passagem à página 228:”Esta
rede de águas pluviais existente não pertence ao condomínio, trata-se de uma sequência de tubulações particulares, e que não
correspondem às do projeto juntado no anexo 01 do presente trabalho, pois sua localização é totalmente diferente”.Nas
respostas aos quesitos apresentados pelo autor, em especial quando perguntado sobre se tais tubulações foram executadas
pelo condomínio, o perito foi categórico em sua resposta ao item 2 à página 231, assim dizendo: “Este projeto, pelo menos na
região envolvida na presente lide, não foi implantado pelo condomínio”. (grifei)Ainda, em resposta sobre ao quesito 5, à página
231, o expert respondeu “Que o dano foi causado pelas águas pluviais, sim. Foi. O problema pode ter ocorrido por
subdimensionamento na tubulação ou na execução da conexão desta tubulação com a da existente no lote 11, na época em que
essa rede foi reconstruída pelo Autor, permitindo vazamento das águas pluviais formando, então, o buraco existente no local”.
(grifei) Aqui, é oportuno lembrar que o juiz não está adstrito às conclusões da perícia, podendo, na dicção do artigo 479 do
Código de Processo Civil, formar livremente seu convencimento, com base nos demais elementos de prova colhidos nos autos.
Em outras palavras, o julgador poderá decidir adotando ou desconsiderando a prova pericial produzida independentemente dela
ter sido ou não impugnada por esta e/ou aquela parte, bastando, para tanto, fundamentar a decisão. Estabelecidas tais
premissas, apesar de o juiz não se vincular ao resultado da prova técnica, e permitir o Código de Processo Civil que ordene a
feitura de outra, tal não pode se dar quando o laudo foi elaborado com observação rigorosa de normas técnicas que lhe são
inerentes, mostrando-se, como no caso, bem feito e convincente. Conforme as respostas apresentadas aos quesitos
supramencionados, a ocorrência do dano também se deu por culpa do autor, tanto que o perito foi categórico em concluir que “a
causa do problema pode ser dimensionamento errado da tubulação e/ou problemas na execução desta caixa de passagem
quando das obras realizadas pelo Autor após as obras de reparação da rede”. (pags. 234/235).Logo, concorrente a culpa do
autor e do réu, a condenação deve ser proporcional à respectiva gravidade das culpas cometidas. Nesse ponto, confira-se a
previsão do Código Civil: “Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será
fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”Assim, considerando o grau de culpa
do autor pela construção da tubulação subdimensionada e a culpa do réu pela omissão na limpeza das bocas de lobo, distribuo
a culpa proporcionalmente em 50% para cada uma das partes. Assim, ainda que o autor tenha demonstrado que as bocas de
lobo estavam obstruídas, ele próprio construiu as tubulações mal dimensionadas, a ponto de evidenciar uma culpa concorrente.
Frise-se, aliás, que o projeto de drenagem de águas pluviais não foi aprovado em assembleia condominial (vide pag. 213), cuja
deliberação se destaca o trecho em que outro morador “também sofreu com fluxo irregular de águas pluviais. Porém de imediato,
tomou medidas no sentido de resolver a questão, fez um sistema de drenagem em suas propriedades, às suas expensas,
colocando galerias de diâmetros compatíveis, sem atribuir o custo ao condomínio. Citou também que inúmeros outros moradores
do Condomínio procederam da mesma forma e que isto é uma tradição adotada pelos moradores.” Logo, o que se conclui é que
ambas as partes concorreram para o acúmulo de águas. Contudo, não se mostra possível atribuir ilicitude ao escoamento das
águas pluviais nas tubulações particulares, ou, como quer o autor, receber indenização mensal por tal utilização, e forçar o
requerido para implantar a tubulação coletiva.Veja que o requerido realizou todos os procedimentos necessários para a abertura
das bocas de lobo, conforme suas atribuições previstas na convenção (fls. 94/103), sendo que os problemas também tiveram
origem na tubulação particular do autor, construída por ele próprio, eis que a tubulação coletiva teve seu projeto submetido à
Municipalidade, mas não foi efetivamente implantada. Ocorre que, conforme exposto alhures, o requerido recebeu a característica
de “loteamento”, o que significa dizer que compete ao Município o “poder-dever” de fiscalizar tal área, inclusive proceder os
reparos necessários da rede de tubulações, afastando tal ônus do requerido, pois sua função se restringe à organização e
gestão dos interesses ali envolvidos. Frise-se que, em cumprimento aos seus deveres, o requerido levou os anseios do autor
perante a assembleia (pags. 215/216), oportunidade em que foi votado um projeto de drenagem envolvendo doze imóveis,
sobretudo o aumento do diâmetro das galerias e a instalação de novas bocas de lobo, o que foi rejeitado pelos moradores.
Ressalte-se, conforme bem observou o perito (pag. 228), que o referido projeto de tubulação coletiva que prevê o contorno da
propriedade do autor não foi aprovado na Prefeitura de Campinas, pois consta apenas um carimbo de “arquivado” pelo
departamento de obras e viação.Nesse viés, o perito concluiu que a implantação do projeto de tubulação coletiva não é a melhor
solução técnica, haja vista a topografia dos imóveis (vide pags. 228/229). Do que se infere dos autos, portanto, incumbia ao
loteador o dever de providenciar o sistema de escoamento de águas pluviais, conforme o projeto submetido à Municipalidade,
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º